A decisão do STF põe fim à guerra do ICMS entre os estados?

O ICMS, Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação, é um dos principais tributos do Brasil. Ele exerce um papel fundamental em termos de arrecadação, garantindo fonte de receita aos estados e municípios. Também é um dos tributos que mais gera discussões, sobrecarregando o sistema judiciário e trazendo insegurança jurídica aos negócios.

Em decisão recente, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou, por unanimidade, que o recolhimento do ICMS na importação ficará a cargo do Estado no qual está domiciliado ou estabelecido o destinatário legal da operação, ou seja, a empresa adquirente da mercadoria importada. A decisão, encerrada no plenário virtual do STF em 27 de abril de 2020, foi publicada em 12 de maio de 2020, no acórdão ARE 665134.

Essa discussão não é nova no STF. O assunto já foi analisado inúmeras vezes anteriormente. A novidade é que agora o STF tratou especificamente das operações via trading e a decisão tomada passou a ter efeito vinculante, ou seja, passou a valer para os demais órgãos judiciais e administração pública que eventualmente discutam questão idêntica.

Segundo o artigo 155, inciso IX da Constituição Federal de 1988, o ICMS incidirá “sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, (…) cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário da mercadoria”.

A Lei Complementar nº 87/96, por sua vez, dispõe que “o local da operação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável é, tratando-se de mercadoria ou bem importado do exterior, o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física

A expressão “estabelecimento destinatário da mercadoria” vem sendo interpretada pela doutrina e pela jurisprudência como “estabelecimento do importador”.

A venda posterior da mercadoria, ainda que em operação triangular, ou seja, com entrega direta ao consumidor, não interfere na determinação do credor do tributo, que continua sendo o Estado onde está estabelecido o importador.

Uma importação pode ser realizada diretamente por uma empresa que deseja, com recursos próprios, adquirir produtos no exterior e depois de sua nacionalização, revender no mercado nacional. Nesse caso, a própria empresa é o importador da mercadoria, pois é aquela que efetua o pagamento, negocia com a empresa estrangeira, etc.

A importação também pode ser realizada com o auxílio de uma trading company, empresa comercial que atua como intermediária entre empresas fabricantes e empresas compradoras. Nesse caso, há dois tipos de operação possíveis.

No caso das operações de Importação por Encomenda – importação de mercadorias pela trading, para futura comercialização à empresa encomendante – o ICMS é devido para o estado de localização da trading, pois ela se enquadra como adquirente da mercadoria (contribuinte que a adquiriu no exterior), ou seja, a trading é o importador.

Se uma trading domiciliada no Rio Grande do Sul, por exemplo, importa por encomenda uma mercadoria destinada a um cliente de Minas Gerais, esta trading será o adquirente / importador, e o ICMS será devido ao Estado do Rio Grande do Sul. A mercadoria desembarcaria no Porto de Santos ou Rio de Janeiro, seguindo direto para Minas Gerais, e o ICMS da importação seria do Rio Grande do Sul mesmo sem a mercadoria nunca ter passado por lá.

Já nas operações de Importação por Conta e Ordem de Terceiros – em que a trading realiza a importação com recursos de terceiro e é contratada apenas para fazer o despacho aduaneiro – o ICMS é devido para o Estado onde se situa a empresa que contratou a trading, pois ela se enquadra como adquirente verdadeiro da mercadoria, ou seja, a empresa contratante é o importador.

Nesse caso, se uma trading domiciliada em Santa Catarina, por exemplo, importa por conta e ordem uma mercadoria destinada a um cliente de São Paulo, a própria empresa será o adquirente / importador, e o ICMS será devido ao Estado de São Paulo.

Segundo pontuou o Ministro Edson Fachin, “o dinamismo das relações comerciais não comporta a imposição da entrada física da mercadoria no estabelecimento do adquirente importador para configurar a circulação de mercadoria”.

Assim, a decisão final em sede de Repercussão Geral, embora infelizmente não assegure o fim das diversas discussões em torno da matéria e tampouco da guerra fiscal entre os estados, tem o potencial de sinalizar pela confirmação do critério jurídico, sendo relevante a contribuintes de diversos mercados.

 

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